quarta-feira, 11 de novembro de 2009

Não sei quantas almas tenho




Não sei quantas almas tenho.


Cada momento mudei.

Continuamente me estranho.

Nunca me vi nem achei.

De tanto ser, só tenho alma.

Quem tem alma não tem calma.

Quem vê é só o que vê,

Quem sente não é quem é,



Atento ao que eu sou e vejo,

Torno-me eles e não eu.

Cada meu sonho ou desejo

É do que nasce e não meu.

Sou minha própria paisagem,

Assisto à minha passagem,

Diverso, móbil e só,

Não sei sentir-me onde estou.



Por isso, alheio, vou lendo

Como páginas, meu ser.

O que segue prevendo,

O que passou a esquecer.

Noto à margem do que li

O que julguei que senti.

Releio e digo: "Fui eu"?

Deus sabe, porque o escreveu.





Fernando Pessoa



1 comentário:

Anónimo disse...

É preciso viver como se pensa, caso contrário se acabará por pensar como se tem vivido

Bourget , P.